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Política

Swissleaks: PF mira 660 brasileiros com contas secretas na Suíça

Três anos após caso, polícia investiga evasão e lavagem de dinheiro

Fachada do HSBC no Centro de Genebra
Foto: FABRICE COFFRINI / AFP
Fachada do HSBC no Centro de Genebra Foto: FABRICE COFFRINI / AFP

BRASÍLIA —  Passados três anos do vazamento de contas secretas de milhares de brasileiros na Suíça no caso que ficou conhecido como Swissleaks , a Polícia Federal do Brasil concluiu a primeira etapa do inquérito criminal aberto sobre o caso e decidiu aprofundar a investigação contra 660 brasileiros suspeitos de manterem contas ou investimentos secretos no HSBC da Suíça. Neste grupo estão grandes empresários de diversos setores da economia — principalmente construção civil, indústria e área financeira.

LEIA : Investigados afirmam que aderiram à repatriação do governo federal

Os crimes sob apuração são evasão de divisas e lavagem de dinheiro, além de outros delitos financeiros que possam surgir. A lista inclui ainda 13 ex-funcionários do HSBC no Brasil que são investigados sob suspeita de terem atuado e auxiliado na abertura das contas secretas e prática de crimes financeiros, totalizando 673 investigados no caso.

Detalhes inéditos do inquérito, que tramita sob sigilo, foram obtidos pelo GLOBO. Após uma minuciosa investigação em um imenso banco de dados, a PF identificou 9.325 clientes da instituição financeira com nacionalidade brasileira e contabilizou que eles mantiveram US$ 15,2 bilhões no HSBC Private Bank Genebra à época dos fatos investigados — o período entre 2006 e 2007. O valor equivale a R$ 53,4 bilhões, pela atual cotação do dólar — para efeitos de comparação, a Petrobras calculou em R$ 6 bilhões o prejuízo que a corrupção provocou aos seus cofres.

O envolvimento de brasileiros no caso Swissleaks foi revelado por uma série de reportagens do GLOBO em parceria com o jornalista Fernando Rodrigues em março de 2015. Os dados secretos do HSBC da Suíça foram vazados por um ex-funcionário do banco, Hervé Falciani, para o Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ, na sigla em inglês), que compartilhou as informações com diversos veículos de comunicação pelo mundo.

A PF conseguiu acesso oficialmente ao banco de dados do HSBC da Suíça em julho de 2015 por meio de cooperação internacional com autoridades francesas. A partir daquele momento, os investigadores brasileiros começaram a montar um banco de dados para tratar a imensa quantidade de informações recebida — 183 tabelas com 40 gigabytes de memória abrangendo dados de clientes de todas as nacionalidades. Os peritos da PF criaram um sistema informatizado para acessar o material e passaram um ano tratando esses dados. Após identificarem os brasileiros, passaram a obter informações da Receita Federal e do Banco Central para complementar a investigação. A apuração é comandada pelo delegado Tomás de Almeida Vianna, da Divisão de Repressão aos Crimes Financeiros e à Lavagem de Dinheiro da PF em Brasília.

Foram usados dois critérios para definir os alvos prioritários. Primeiro, os que possuíam maior quantidade de dinheiro nos ativos do HSBC suíço. Segundo, os que apareciam como vinculados a mais de dez contas, que poderiam ser fundos de investimentos, títulos financeiros, contratos de derivativos, depósitos ou diversos outros tipos de ativos financeiros.

A PF enviou à Justiça Federal de Brasília o primeiro relatório parcial do inquérito, em janeiro do ano passado, no qual relatou todo o trabalho feito até aquele momento. Em novembro, a PF enviou um novo relatório contendo a lista de todos os alvos da investigação e solicitando à Justiça que desmembrasse o inquérito para 12 unidades da PF nos Estados, sob o argumento de agilizar o desfecho das apurações. No início deste ano, a Justiça Federal autorizou o desmembramento do caso, permitindo que a investigação avance à sua fase final. “Hoje, imperioso se mostra o aprofundamento da investigação para verificarmos, caso a caso (...), a situação real de cada investigado, no que será a fase derradeira, ao menos no horizonte atual, da presente investigação”, escreveu a PF.

Nesta última fase, a PF vai analisar se os ativos no exterior haviam sido declarados pelos investigados às autoridades brasileiras — Receita Federal e Banco Central. Deter conta no exterior por si só não é crime, mas a situação se torna grave caso os ativos não tenham sido declarados, já que o detentor deveria pagar impostos referentes a esses recursos. Os investigadores já têm em mãos as quebras de sigilo bancário e fiscal referente ao período investigado para conferir se houve irregularidades. Diversos dos alvos do caso, porém, aderiram ao programa de repatriação de recursos no exterior (leia abaixo).

PF EM SP INVESTIGARÁ PRINCIPAIS NOMES

Nesta última fase do inquérito do Swissleaks, passam a figurar formalmente como investigados no caso grandes nomes do PIB nacional. O GLOBO identificou que a lista contém 101 empresários (ou familiares) vinculados à construção civil e setor imobiliário, 100 do setor industrial, 81 da área financeira e 35 de transporte.

O critério para distribuição dos casos foi pelo domicílio fiscal dos alvos. Caberá agora à Superintendência da PF em São Paulo investigar os principais nomes. Entre eles estão o presidente da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), Benjamin Steinbruch, o banqueiro André Esteves (sócio do BTG Pactual), o presidente da Tecnisa Joseph Meyer Nigri, o dono da incorporadora Rossi Residencial Edmundo Rossi Cuppoloni, o ex-presidente da Galvão Engenharia Dario de Queiroz Galvão Filho, e o sócio da construtora Queiroz Galvão Carlos de Queiroz Galvão. Todos eles têm também familiares vinculados aos ativos no HSBC da Suíça.

Na lista de investigados pela PF em São Paulo também estão Carlos Alberto Massa, o Ratinho, e os donos do banco Tricury, José Roberto Cury e Jorge Cury Neto. Ambos afirmaram que os valores foram declarados às autoridades brasileiras.

A Superintendência da PF no Rio cuidará principalmente da investigação sobre os empresários do setor de ônibus, capitaneados por Jacob Barata Filho, um dos alvos da investigação. Além dele, ao menos mais 28 pessoas ligadas ao setor e seus familiares aparecem vinculados a contas no HSBC da Suíça. Também são alvos no Rio o empresário Carlos Francisco Ribeiro Jereissati e familiares — dono do grupo empresarial que controla o shopping Iguatemi, o Grande Moinho Cearense e que foi acionista majoritário da Oi. Carlos é irmão do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), que não aparece na lista de investigados do caso, por não terem sido identificadas contas vinculadas a ele.

Outro grande empresário, Lírio Albino Parisotto, que atua na área petroquímica e é considerado um dos mais ricos do Brasil, vai ser investigado pela PF no Amazonas. No Ceará, os alvos do inquérito serão a família do empresário Edson Queiroz Filho, que morreu em 2008, dona do grupo Edson Queiroz, afiliado da TV Globo no estado.

Detalhes da investigação

Casos são desmembrados pelos estados brasileiros

Os números

9.325

US$ 15,2

673

Clientes com nacionalidade brasileira no banco de dados do HSBC da suíça

bilhões de dólares era o total de ativos financeiros mantidos pelos brasileiros no banco suíço

alvos prioritários da investigação, incluindo 660 brasileiros e

13 ex-funcionários

As suspeitas

A PF apura se houve evasão de divisas e lavagem de dinheiro nas contas do Swissleaks, dentre outros crimes financeiros

Os investigadores vão analisar se os brasileiros haviam declarado suas contas às autoridades do país, para saber se houve algum possível crime

Manter conta no exterior não é ilegal, desde que os ativos sejam declarados à Receita Federal e ao Banco Central

Alguns

investigados

André Esteves

Benjamin Steinbruch

e familiares

SÓCIO DO BTG PACTUAL

SÓCIO DA COMPANHIA

SIDERÚRGICA NACIONAL

O QUE ELE DISSE

Defesa afirma que todos seus ativos estão devidamente declarados às autoridades

O QUE ELES DISSERAM

Procurado, o empresário não se manifestou

Edmundo Rossi

Cuppoloni e familiares

Rony Hamoui

e familiares

Carlos Jereissati

e familiares

DONO DA INCORPORADORA

ROSSI RESIDENCIAL

SÓCIO DA ASIA ASSET, GRUPO

DE INVESTIMENTOS FINANCEIROS

DONO DO GRUPO DO

SHOPPING IGUATEMI E EX-

ACIONISTA MAJORITÁRIO DA OI

O QUE ELES DISSERAM

Procurada, a empresa não respondeu

O QUE ELES DISSERAM

Valores da família no exterior foram declarados na repatriação, em 2016

O QUE ELES DISSERAM

Todos os bens e recursos, no Brasil e no exterior, foram regularmente declarados segundo as normas previstas na legislação brasileira

Carlos Massa (Ratinho)

e familiares

Jacob Barata Filho

e familiares

José Roberto Cury,

Jorge Cury Neto

e familiares

APRESENTADOR DE TV

EMPRESÁRIO DO SETOR

DE TRANSPORTES DO RIO

DONOS DO BANCO TRICURY

O QUE ELES DISSERAM

As aplicações financeiras no HSBC Invest Bank/Suíça estavam devidamente declaradas as autoridades brasileiras e em conformidade

com a lei

O QUE ELES DISSERAM

A defesa da família Barata Filho informa que a repatriação seguiu a legislação, com o pagamento de todos os impostos

O QUE ELES DISSERAM

Desconhecemos qualquer investigação da Polícia Federal e informamos que todos os ativos que possuímos estão declarados às autoridades brasileiras

Histórico

Fevereiro de 2015

Março de 2015

Consórcio de jornalistas e o jornal “Le Monde” publicam reportagens a partir de dados passados por ex-funcionário do HSBC na Suíça

O GLOBO integra a equipe de apuração e começa a publicar os dados das contas secretas de brasileiros no banco suíço

Julho de 2015

Janeiro de 2017

PF recebe dados do banco por meio de cooperação com o governo da França e começa a investigar o caso

PF envia à Justiça Federal do DF relatório com a lista dos investigados e um balanço das investigações até aquele momento

Novembro de 2017

Março de 2018

No fim da primeira fase de investigação, PF envia à Justiça lista com 673 brasileiros alvos de inquérito e solicita desmembramento

12ª Vara da Justiça Federal do DF devolve o inquérito para a PF dar prosseguimento ao desmembramento aos estados

Detalhes da

investigação

Casos são desmembrado

pelos estados brasileiros