Por Gilberto Simioni *
 
Gilberto Simioni
(foto: arquivo pessoal)

Quando Pelé completou 40 anos, estava hospedado no Hotel Jequitimar, no Guarujá, litoral de São Paulo. Um jornalista, para afrontá-lo, perguntou: Como é, Negão. Agora que você está com 40 anos e não mais tem o fôlego dos 20 anos, como vai fazer com sua vida profissional?

Pelé, muito educadamente, respondeu: Moço, quando eu tinha 20 anos, corria atrás da bola. Agora, aos 40, já sei fazer a bola correr. Ainda jogou mais um ano no Santos e cinco no Cosmos americano.

O melhor hotel da região de Guaratinguetá tem um quadro de gerentes e chefias, todos acima de 40 anos. Há pessoas já aposentadas por tempo de serviço, outras com seus 60 anos. Sempre tem um jovem grudado no profissional experiente, para amadurecer mais rápido, substitui-lo um dia.

Há tempos, diretores resolveram testar um novo chef de cozinha, 30 e poucos anos, o melhor aluno recém saído da Escola de Gastronomia. E um maître quase quarentão. Ambos só haviam trabalhado em capitais, como Florianópolis e São Paulo. Nada conheciam de hotel de interior, resort, banquete. Havia dias em que eram servidos poucos couverts, à la carte, Sugestão do Chef. Mas em alguns fins de semana, recebiam até três casamentos, grupos, convenção, eventos, churrasco, banquete. Por volta de 1 mil pessoas num só dia.

Os mais velhos tinham know-how da clientela, do atendimento, do serviço. Tecnologia para passar de alguns para centenas de couverts num só dia. Como dizia o gerente de RH Corporativo: “Eles sabem onde acender e apagar as luzes.”

Felipe Massa, apesar de jovem, é experiente. Conhece todas as pistas de F-1, pois já correu, desde os 16 anos, em categorias menores. Conhece cada curva, cada ondulação. Por isso tem mais facilidade em vencer, além de ter um dos melhores carros e ser ótimo piloto.

É um absurdo e um desperdício que um profissional de hotelaria seja considerado velho com mais de 35 anos no Brasil. Mesmo aqueles que não fumam, não bebem, têm boa saúde, fazem exercícios regularmente, são ativos.

Certa vez uma diretora (era dona, não administradora, nem hoteleira), disse ao candidato cinquentão que queria um gerente que corresse. Correr, por que, para que? Perguntou o candidato. Ela não soube responder. Porque não tinha idéia das atividades, responsabilidades de um gerente. Imagine um maestro de orquestra sinfônica correndo de um em um de seus músicos e fazendo seus papéis, tocando seus instrumentos. Querendo fazer tudo e esquecendo de reger a orquestra.

Ser administrador hoteleiro, planejador, estrategista, que se cerca de pessoas competentes, que não precisa provar a ninguém que é competente, pois os números falam por si, é difícil encontrar. E essas pessoas ofuscam aqueles que se julgam entender de hotelaria, sem saber como se serve uma mesa, se faz um prato, acolhe um cliente, opera um evento, sem nunca haver participado de uma reunião do trade, sindicato, escola de hotelaria, Equipotel.


Temos vários exemplos de profissionais competentes e com fôlego na hotelaria, mesmo passando dos 60 anos: Amilton Paes de Souza (ex-Novotel), Guilherme Repanas (ex-Deville), Sérgio Luppi (Meliá), Edson Caetano (Atlantica), Virgílio Casaca.
 
Nos anos 80, a GR.SA Generalle de Restauration Collective, do grupo Accor, tinha o “Seu” Antônio, ex-gerente de Operações, aposentado, como se fora um consultor/gerente. Quando um restaurante tinha problemas de budget e o gerente solicitava ajuda, lá ia ele, ajudar a colocar a casa em ordem, sem ligar para horário, folga, local, cidade. Ele sabia de onde vinha a água do rio e para onde iria.
 
Hotelaria não é só dar lucro mensal ao quotista, acabando com o patrimônio físico e humano, o nome do hotel, a clientela. É seduzir, encantar, surpreender o cliente. Mantê-lo a vida toda feliz, conosco.
 
Hotel é um lugar onde as pessoas são felizes. Flat é um lugar de pessoas sós, separadas, longe da família. Spa não é hotel. É um departamento médico. É o inferno particular dos gordinhos.

 

Dizia Mr. Percival Ghion e sua esposa Mrs. Tracy Ghion, consultores/gerentes anglo-canadenses, nos anos 70, no Guarujá, que hotel se compara a uma gaiola. Mas quem canta é o passarinho. Quanto mais horas de gaiola e de canto, melhor a melodia.

* Gilberto Simioni é administrador e consultor hoteleiros


Contato

[email protected]

11 9616-6088