Guia da Semana

À medida em que a Mostra Internacional de Cinema vai se desenrolando em São Paulo, os críticos do Guia da Semana vão revelando suas impressões sobre os principais filmes em cartaz. Confira:

A Bruxa
(The Witch, Robert Eggers, EUA/ Canadá, 2015, 92 min)

Avaliação: Regular

“A Bruxa” é um filme que pode enganar. À primeira vista, parece ser um horror cheio de simbolismos sobre uma família oprimida pela religião – cujo pai, fanático, insiste em lembrar os filhos a todo o tempo de que são pecadores e, possivelmente, irão para o inferno. Mas, à medida em que a história vai se desenvolvendo, fica claro que não existe um objetivo por trás dos símbolos - eles já não simbolizam nada que não sejam os clichês do gênero: um bode, um corvo, uma velha, uma floresta, etc, etc, etc. Tudo o que você já viu.

A Floresta Que Se Move
(Vinícius Coimbra, Brasil, 2015, 99 min)

Avaliação: Bom

Gabriel Braga Nunes e Ana Paula Arósio são os protagonistas desta interpretação contemporânea de Macbeth. Como na peça, ele (aqui chamado Elias) ouve uma profecia que lhe informa que, muito em breve, será rei – ou, no caso, presidente do banco onde trabalha. Instigado pela notícia e estimulado pela esposa (Arósio), Elias decide cometer um assassinato para acelerar a promoção, mas logo descobre que um crime vem acompanhado por outros. O filme traz uma versão interessante e bastante atual para a história e ganha pontos pela fotografia bem trabalhada e pela trilha sonora envolvente. O ponto negativo são as falas, que soam muito pouco naturais, mesmo sem as expressões arcaicas da obra de Shakespeare. Leia a crítica completa.

A Jornada de Chasuke
(Ten no Chasuke, Sabu, Japão, 2015, 109 min)

Avaliação: Regular

“A Jornada de Chasuke” parte de uma premissa muito curiosa – a de que roteiristas celestiais escrevem as vidas dos humanos num longo pergaminho, e que uma alteração em qualquer uma das histórias tem efeitos em todas as outras – mas se perde no caminho. Filmado com uma câmera insegura (que abusa do slow motion), o longa deixa o realismo fantástico escorregar para um discurso religioso ao mostrar seu protagonista, um servidor de chá dos céus que desce à Terra para impedir um acidente, numa espécie de anjo milagroso. Uma boa ideia mal aproveitada.

Aliança do Crime
(Black Mass, Scott Cooper, EUA, 2015, 122 min)

Avaliação: Excelente

Johnny Depp mostra uma atuação como seus fãs nunca viram ao interpretar James “Whitey” Bulger, um chefão do crime em Boston que se tornou famoso após ajudar o FBI a erradicar a máfia italiana, abrindo caminho para assumir o controle de toda a região. O filme aposta numa abordagem intimista e faz o público sentir a tensão que sentem os colaboradores de Bulger em sua presença. Leia a crítica completa.

As Mil e Uma Noites (Volume 1: O Inquieto)
(Miguel Gomes, Portugal, 2015, 125 min)

Avaliação: Ruim

Dividido em três filmes (cada qual com mais de duas horas), “As Mil e Uma Noites” é um exercício de reflexão e paciência de Miguel Gomes, que se debruça sobre a crise econômica europeia com um compilado de episódios fantásticos que, às vezes, soam mundanos demais para darem conta do tema. Tecnicamente, o primeiro longa é bastante cru e não impressiona. O segundo, foi eleito para representar Portugal no Oscar 2016.

Body
(Cialo, Malgorzata Szumowska, Polônia, 2015, 90 min)

Avaliação: Excelente

Depois do sucesso de "Elles" (2011), Malgorzata Szumowska volta às telas unindo, mais uma vez, direção impecável a um roteiro denso diluído em pequenas doses de humor. Vencedor do Leão de Prata no último Festival de Berlim, "Body" cruza as histórias de um perito criminal, sua filha anoréxica e a terapeuta da garota. Na trajetória, o espectador é confrontado com três abordagens completamente distintas sobre o corpo e a alma.

Califórnia
(Marina Person, Brasil, 2015, 91 min)

Avaliação: Muito bom

O primeiro longa-metragem de ficção dirigido pela ex-DJ Marina Person resgata lembranças de uma juventude dos anos 80 com uma identificação sincera e deliciosa. Estela é uma adolescente às voltas com sua primeira menstruação e sua virgindade, confissões que compartilha com seu tio Carlos (Caio Blat), que mora na Califórnia. Seu sonho é fazer uma road trip com ele em busca de novos sons e referências cults de cinema, mas a realidade decide bater à porta quando ele volta ao Brasil, com uma doença incurável.

David
(David, Jan Tesitel , República Tcheca, 2015, 80 min)

Avaliação: Muito Bom

Com "David", o tcheco Jan Tesitel marca sua estreia com uma breve crônica sobre a vida do personagem título. Cansado da posição da família em relação a sua deficiência intelectual, o garoto foge de casa e enfrenta, nas ruas de Praga, suas primeiras experiências com a "vida real". Um olhar profundo e sincero sobre a introspecção e as relações familiares.

Dheepan
(Jacques Audiard, França, 2015, 109 min)

Avaliação: Muito bom

O vencedor da Palma de Ouro lida com um dos temas mais urgentes na Europa atual: a imigração. Os protagonistas são Dheepan, Yalini e Illayal – três pessoas que nem têm, realmente, esses nomes, nem se conhecem, mas assumem os passaportes de uma família morta para emigrar do Sri Lanka para a França.

Girls Lost
(Pojkarna, Alexandra-Therese Keining, Suécia, 2015, 106 min)

Avaliação: Excelente

Três meninas nos seus 14 anos lidam diariamente com o bullying na escola por não se vestirem como as outras garotas, por não terem corpos sensuais ou, simplesmente, por serem mulheres. Sua visão sobre o universo masculino é testada quando, magicamente, elas descobrem uma planta cuja semente pode transformá-las em garotos. Com uma fotografia belíssima e uma edição muito sensível, o filme explora a fundo o tema da sexualidade adolescente, investigando preconceitos, medos e curiosidades de um jeito doce e, ao mesmo tempo, agressivo. Será um desperdício se não estrear nos cinemas.

Minha Irmã Magra
(Min Lilla Syster, Sanna Lenken, Suécia/ Alemanha, 2015, 95 min)

Avaliação: Excelente

“Minha Irmã Magra” conta a história de Stella, uma menina gordinha e tímida cuja irmã mais velha é patinadora, talentosa, popular e, como ela acaba de descobrir, anoréxica. O filme desenvolve o drama a partir do olhar da criança e de seus conflitos - já que, apesar de saber do problema, Stella não pode contar a ninguém. Delicado e marcante, o longa ajuda a jogar luz sobre um tema pouco compreendido, mas urgente, sem soar panfletário, permitindo momentos de riso pontuados em meio à tensão crescente. Um dos melhores “achados” da Mostra neste ano.

Mistress America
(Noah Baumbach, EUA, 2015, 84 min)

Avaliação: Excelente

Depois de surpreender crítica e público com “A Lula e A Baleia” (2005) e “Frances Ha” (2014), Noah Baumbach retorna aos cinemas em mais uma parceria com Greta Gerwig, na comédia intelectual “Mistress America”. O filme, delicioso e diferente, conta a história de uma garota (Lola Kirke) que sonha em ser escritora, mas se sente deslocada e inferior ao ingressar numa universidade em Nova York. Lá, ela conhece a popular e encantadora Brooke (Gerwig), 12 anos mais velha, que a ajuda a encontrar sua auto-estima e traçar o próprio destino.

Nós Monstros
(We Monsters, Sebastian Ko, Alemanha, 2015, 95 min)

Avaliação: Excelente

Drama com pitadas de thriller, "Nós Monstros" surpreende do começo ao fim, prendendo o espectador à uma intensa trama psicológica. O filme segue a trajetória de Paul e Christine, casal divorciado, para esconder um suposto assassinato cometido por sua problemática filha. Quando a culpa reúne a família, é criada, com maestria, uma rede de mentiras e consequências inimagináveis.

Príncipe
(Prins, Sam de Jong, Holanda, 2015, 78 min)

Avaliação: Excelente

Vencedor do Generation 14plus no último Festival de Berlim, o primeiro longa-metragem do holandês Sam de Jong narra os dias da vida de Ayoub, jovem muçulmano crescendo em meio ao submundo do crime da cidade grande. Com co-produção assinada pela descolada Vice, o filme capricha na direção de arte sem deixar de lado o tom crítico ao tocar (mesmo que brevemente) em assuntos como a imigração na Europa e as próprias desventuras (às vezes violentas) da juventude.

Sob Nuvens Elétricas
(Pod elektricheskimi oblakami, Aleksey German, Rússia/ Ucrânia/ Polônia, 2015, 138 min)

Avaliação: Muito bom

O longa russo explora o futuro próximo com um realismo poético e uma consciência crítica que se expressa nos silêncios e nas imagens. O filme se passa em 2017, cem anos após a Revolução Russa, e parte da construção de um edifício para encadear diferentes histórias de personagens com visões particulares sobre o passado e o futuro, a realidade e a ficção, a comunicação e a globalização, a racionalização e o amor. O longa levou o Urso de Prata no Festival de Berlim este ano.

Um Novo Você
(Brand New-U, Simon Pummell, Reino Unido, 2015, 100 min)

Avaliação: Ruim

Uma empresa futurística oferece a possibilidade de o cliente mudar de vida, encontrando uma versão mais evoluída de si mesmo (um “idêntico”, que pode viver anos à frente ou em outro local) e assumindo o lugar dela. Apesar da premissa interessante, o filme não funciona como uma verdadeira ficção científica, mas sim como uma história de amor disfarçada de sci-fi, com dezenas de clichês e situações confusas que não significam nada.

Wanja
(Wanja, Carolina Hellsgård, Alemanha, 2015, 87 min)

Avaliação: Muito Bom

Parte da Competição Novos Diretores, "Wanja" narra a história da personagem título que, após sair da prisão, tenta reconstituir uma nova vida. No caminho, encontra a problemática Emma e mergulha em uma instigante relação com a jovem. Apesar da narrativa lenta, Carolina Hellsgard consegue segurar o espectador com a iminência de um final surpreendente.

Zoom
(Pedro Morelli, Brasil/ Canadá, 2015, 96 min)

Avaliação: Excelente

Dirigido por Pedro Morelli (“Entre Nós”) e escrito por Matt Hansen, o filme é uma co-produção entre Brasil e Canadá que surpreende em muitos sentidos. A história gira em torno de uma menina (Alison Pill) que trabalha numa fábrica de bonecas sexuais e sonha em ter seios maiores. Mas também gira em torno de um diretor de cinema (Gael García Bernal) que tenta aprovar seu projeto mais autoral, e de uma modelo (Mariana Ximenes) que tenta terminar seu primeiro livro. Cada história existe dentro da outra, como uma criação de um dos personagens, e essa brincadeira com “a ficção como vida própria” rende ótimas reflexões. O humor também é muito bem dosado. Diferente e bem acabado.

Por Juliana Varella e Ricardo Archilha

Atualizado em 1 Nov 2015.