Política Impeachment

Dilma diz a jornalistas estrangeiros que não é uma mulher fraca

Presidente garante que paz vai reinar nas Olimpíadas do Rio

Dilma concede entrevista a jornais estrangeiros
Foto: Roberto Stuckert Filho/ Divulgação Presidência
Dilma concede entrevista a jornais estrangeiros Foto: Roberto Stuckert Filho/ Divulgação Presidência

BRASÍLIA - Diante da repercussão internacional da crise política em que está envolvida, a presidente Dilma Rousseff reforçou nesta quinta-feira, a jornalistas estrangeiros, o o discurso de que o processo de impeachment carece de bases legais, e que tirá-la do poder sem justificativa é golpe. Segundo ela, o movimento que estaria sendo engendrado agora não se compara ao golpe militar executado na década de 60, mas o sucesso do impeachment seria a ruptura da ordem democrática. Dilma afirma que querem a renúncia dela para evitar retirarem um mandato legítimo de forma “indevida, ilegal e criminosa”.

— Nós tivemos golpes de Estado militares em nossa história. Em um sistema democrático, esses golpes mudam de forma. Cada regime tem seu tipo de golpe. A Constituição garante direitos e em um golpe você subverte esses direitos e perverte a ordem democrática. E isso é perigoso. Sem base legal, esse processo é um golpe contra a democracia. E as consequências disso não sabemos, porque não temos capacidade de prever o futuro — afirmou, segundo o diário espanhol El Pais.

Na véspera, os ministros do STF Dias Toffoli e Cármem Lúcia afirmaram que, se for respeitada a Constituição, impeachment não é golpe. A entrevista foi concedida a jornalistas do “El Pais” (Espanha), “The Guardian” (Inglaterra), “The New York Times” (Estados Unidos), “Le Monde” (França) e “Página 12” (Argentina).

O Guardian ressaltou que Dilma distinguiu o que seria o golpe atual do golpe militar que jogou o Brasil numa longa ditadura.

— Eu não estou comparando o golpe de agora com os golpes militares do passado, mas seria a ruptura da ordem democrática no Brasil — disse a presidente.

A decisão de convocar jornalistas de veículos internacionais vem sendo executada desde o início da semana. Depois que importantes publicações passaram a defender, em seus editoriais, a renúncia da presidente, José Eduardo Cardozo (advogado geral da União) falou com correspondentes estrangeiros em São Paulo, e Jaques Wagner (chefe de gabinete de Dilma) fez o mesmo no Rio.

PREVISÃO CONSTITUCIONAL

Personalidade de 2015 do Prêmio Faz Diferença, do GLOBO em parceria com a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro ( Firjan), Cármen Lúcia se posicionou na noite de quarta-feira sobre a legalidade do processo:

— Tenho certeza que a presidente deve ter dito que, se não se cumprir a Constituição é que poderia haver algum desbordamento. Não acredito que ela tenha falado que impeachment é golpe. O impeachment é um instituto previsto constitucionalmente.

Já Dias Toffoli disse que o impeachment é um instrumento democrático:

—Não se trata de um golpe. Todas as democracias têm instrumentos de controle, e o impeachment é um tipo de controle.

Sobre a participação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em seu Ministério, que ainda depende de decisão do plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), Dilma disse que não há como impedir que ele ajude o governo, seja como ministro da Casa Civil, seja como assessor. De acordo com matéria do El Pais, a presidente afirmou que seu antecessor é “seu companheiro” e o defendeu das acusações de que ele só decidiu entrar no governo para escapar das investigações da Lava-Jato. Sua argumentação é que, com foro privilegiado, Lula passa a ser investigado pelo STF.

— O que acontece é que Lula iria fortalecer meu governo, e os partidários do quanto pior, melhor não querem isso. Agora, digo uma coisa: ou ele vem como ministro ou vem como assessor, de uma maneira de ou outra. Não tem como impedir.

Dilma investe sobre a imprensa estrangeira para registrar a sua visão sobre a crise política que enfrenta. Em um evento com centenas de juristas pela legalidade e em defesa da democracia esta semana, no Planalto, a presidente radicalizou o discurso, denunciando um “golpe em curso”. Ontem, com os repórteres estrangeiros, voltou a dizer que não renunciará.

— A oposição me pede que eu renuncie. Por quê? Por que sou uma mulher fraca? Não, não sou uma mulher fraca. Minha vida não foi isso. Pedem que eu renuncie para evitar tirarem uma presidente eleita, de forma ilegal, indevida e criminosa. Pensam que devo estar muito afetada, que devo estar completamente desestruturada, muito pressionada. Mas não estou assim, não sou assim — disse, lembrando que lutou duramente contra a ditadura militar.


Dilma diz a jornalistas estrangeiros que não é uma mulher fraca
Foto: Roberto Stuckert Filho/ Divulgação Presidência
Dilma diz a jornalistas estrangeiros que não é uma mulher fraca Foto: Roberto Stuckert Filho/ Divulgação Presidência

Segundo reportagem do “The Guardian”, Dilma argumentou que qualquer tentativa de tirá-la do poder ilegalmente deixaria cicatrizes profundas na democracia brasileira. Aos jornalistas, Dilma apontou que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que deu início ao processo de impeachment, é réu por corrupção. Afirmou que a oposição não aceitou a derrota apertada que sofreu nas últimas eleições e vem sabotando a agenda legislativa, o que está afundando o país.

De acordo com o “El Pais”, Dilma disse que Cunha quis barganhar com o governo o apoio da base aliada contra a abertura de um processo de cassação do mandato dele no Conselho de Ética da Câmara em troca de não aceitar o pedido de impeachment.

Dilma se disse favorável aos protestos de rua, porque veio de “uma geração em que se você abrisse a boca poderia ir para a prisão”, mas ressaltou que os que se manifestaram pelo impeachment representam menos de 2% da população brasileira. A presidente também criticou “métodos fascistas” usados por alguns opositores. O “The New York Times” descreveu como Dilma diz reagir aos protestos pelo impeachment.

— Não vou dizer que é agradável ser vaiada, mas eu não sou uma pessoa depressiva. Eu durmo bem à noite — garantiu.

Com relação às acusações que pesam sobre o marqueteiro de suas campanhas eleitorais, João Santana, Dilma negou que tenha recebido financiamento ilegal. Perguntada se aceitará a decisão do Congresso de tirá-la da Presidência, caso o impeachment seja aprovado, Dilma respondeu:

— Nós iremos apelar com todos os métodos legais disponíveis.

Segundo os repórteres do Guardian, Dilma estava animada e calma ao longo de toda a entrevista e só demonstrou irritação quando perguntada sobre a decisão do juiz Sérgio Moro de divulgar as conversas que teve com Lula, o que ateou mais fogo na crise política. Ao defender que houve violação da privacidade, dizem os jornalistas, Dilma bateu na mesa.

OPOSIÇÃO CRITICA ENTREVISTA

A oposição criticou a fala da presidente, classificando-a como um discurso que tenta confundir a população.

— O momento é de desespero do governo. A legalidade se rompe quando ela quer nomear um ministro para criar uma fuga da Justiça — afirmou o vice-líder do PSDB na Câmara, Nilson Leitão, referindo-se à escolha de Lula para a Casa Civil.

O líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO), criticou o teor da entrevista:

— Dilma acha que dar entrevistas alardeando mentiras a correspondentes vai convencer. Os jornalistas estrangeiros acompanham de perto a crise criada pelo PT e sabem que foi o próprio partido que cavou o buraco em que está. O impeachment é legal, constitucional e tem respaldo do STF.

Já o presidente do PSB, Carlos Siqueira, afirmou que o discurso da presidente pode causar danos à imagem do país:

— Dizer que há um golpe de Estado, nós não podemos aceitar. Essa mentira vai custar caro à imagem do nosso país. O ministro Dias Toffoli foi claro e até pedagógico para demonstrar que no Brasil não está havendo golpe contra quem quer que seja.