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A Lava Jato confirma o elo do petrolão com o caso Celso Daniel

A Lava Jato confirma o elo do petrolão com o caso Celso Daniel

Em sua 27ª fase, a operação investiga as ligações entre o petrolão, o mensalão e o caso Celso Daniel

DANIEL HAIDAR
01/04/2016 - 21h50 - Atualizado 01/04/2016 21h50
Policiais  na 27 fase da Lava Jato  chegando na sede do jornal Diário do Grande ABC (Foto: Danilo Verpa/Folhapress)

Em 18 de janeiro de 2002, o então prefeito de Santo André, Celso Daniel (PT), foi sequestrado. Seu corpo foi achado dois dias depois, torturado e morto a tiros, em uma estrada de Itapecerica da Serra, município da Grande São Paulo. Enquanto buscavam o assassino, o Ministério Público e a polícia de São Paulo tropeçaram numa sofisticada rede de corrupção. Durante muito tempo, MP e polícia tentaram achar uma ligação entre as duas coisas – a rede de corrupção e o assassinato de Celso Daniel. Nada ficou provado, embora o irmão do prefeito, Bruno Daniel, tenha dito em várias entrevistas que Celso foi morto por tentar acabar com o esquema e ainda exista um processo penal em curso sobre o assassinato do ex-prefeito. Em 2012, o assunto ressurgiu quando o publicitário Marcos Valério Fernandes, preso em Belo Horizonte, disse ao Ministério Público Federal que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e os ex-ministros José Dirceu e Gilberto Carvalho foram chantageados pelo empresário Ronan Maria Pinto, um dos acusados de pagar propina para a prefeitura de Santo André. Em 23 de outubro de 2014, o doleiro Alberto Youssef, em delação premiada, disse que um subordinado guardava “a sete chaves” contratos que faziam referências a transações de Marcos Valério e Ronan. A 27ª fase da Operação Lava Jato, chamada de Carbono 14, visa esclarecer essa chantagem – que, segundo Valério, fora denunciada pelo secretário-geral do PT, Silvio Pereira. Pereira, a exemplo de Ronan, foi preso temporariamente na sexta-feira dia 1º por ordem do juiz Sergio Moro. E investigar os elos entre o caso Celso Daniel, o mensalão e o petrolão que, segundo a força-tarefa da Lava Jato, podem ser esquemas urdidos pela mesma “organização criminosa”.

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O nome Carbono 14 é uma alusão a uma técnica de análise de cadáveres antigos. Os investigadores da Lava Jato chegaram ao caso Celso Daniel fazendo o caminho cronologicamente inverso – as pistas que levavam a Santo André começaram a aparecer durante a investigação do petrolão. Os primeiros indícios do elo entre os esquemas apareceram no início da Lava Jato, com os contratos apreendidos com a contadora do doleiro Alberto Youssef, e foram reforçados pela delação dele. A investigação ganhou fôlego com o acordo de delação premiada do ex-gerente da Petrobras Eduardo Musa. Ele confessou ter recebido US$ 720 mil em pagamentos de propina em contas suíças para favorecer a construtora Schahin, em um contrato de US$ 1,6 bilhão na Petrobras. A contratação – de acordo com o que o próprio Musa disse em agosto do ano passado – foi uma contrapartida para recompensar a família Schahin por um empréstimo de R$ 12 milhões, jamais quitado, ao pecuarista José Carlos Bumlai, ligado a Lula. Salim Schahin, um dos sócios do conglomerado, também fechou acordo de delação premiada e confirmou a negociação.

A partir daí, o depoimento de Marcos Valério em 2012 ganhou nova relevância. Tornou-se imperioso investigar se Valério tinha usado o dinheiro do empréstimo para comprar o silêncio do empresário Ronan. De acordo com os investigadores, os contratos “guardados a sete chaves”, em que eram apontadas transações de Valério e Ronan, podem ser uma alternativa de lavagem de dinheiro – que acabou não sendo utilizada por razões ainda desconhecidas. Ou seja, Valério não operou pela compra do silêncio, mas os depoimentos dos delatores da Lava Jato e provas colhidas até agora permitem concluir que ele sabia da história.

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O rastreamento bancário e a confirmação do empréstimo fraudulento colocaram Bumlai na cadeia em novembro passado – hoje ele cumpre prisão domiciliar para tratar um câncer na bexiga. Bumlai confessou o empréstimo fraudulento, mas disse não conhecer o beneficiário final dos pagamentos. Desde a prisão do pecuarista os investigadores já sabiam que pelo menos R$ 6 milhões tinham sido apropriados, de fato, pelo empresário Ronan.

Segundo as investigações, os R$ 12 milhões fizeram caminhos tortuosos. O dinheiro passou por três camadas de lavagem. De Bumlai, seguiram R$ 12 milhões para o frigorífico Bertin. A empresa, por seu turno, repassou pelo menos R$ 6 milhões a um laranja – o empresário carioca Oswaldo Vieira Filho. Vieira Filho colaborou com as investigações, sem acordo de delação premiada, e confirmou em depoimento que participou do negócio a pedido de um amigo, o empresário Luiz Carlos Casante. Os dois divergem sobre quem foi que trouxe a proposta de negócio. De qualquer jeito, os intermediários dividiram uma comissão de quase R$ 400 mil pela operação.

O desfecho da operação de lavagem de dinheiro foi a chegada de cerca de R$ 3 milhões para a Expresso Nova Santo André, uma empresa de Ronan. Com o dinheiro, transferido de uma empresa de Vieira Filho, Ronan comprou uma participação acionária no jornal Diário do Grande ABC. Mas não houve só o benefício direto. Vieira Filho, o laranja, pagou um total de R$ 2,5 milhões para fabricantes de ônibus, como pagamento pela compra de veículos para as empresas de Ronan. Por que dinheiro do petrolão foi repassado pelo amigo de Lula ao empresário Ronan? Extorsão, segundo o depoimento de Marcos Valério. Depoimento que explica muito, mas não conta tudo. Daí a necessidade das investigações deflagradas hoje pela Lava Jato.








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