Sexo pode resultar em depressão? (Foto: NYT)
Como todo mundo sabe, sexo é gostoso.
Será? Nos últimos anos, cruzei com diversos
pacientes para quem o sexo não só não traz prazer, como
aparentemente também causa danos.
Um paciente, um jovem de 20 e poucos anos,
descreveu dessa forma: "Após o sexo, me sinto dolorido e
deprimido por um dia."
Fora isso, ele tinha uma ficha limpa de saúde,
tanto médica quanto psiquiátrica: bem adaptado, trabalhador,
vários amigos e uma família unida.
Acredite, eu poderia ter inventado facilmente uma
explicação. Ele tinha conflitos ocultos a respeito de sexo, ou
sentimentos ambivalentes sobre sua parceira. Quem não tem?
Porém, por mais que eu procurasse, não podia
encontrar uma boa explicação. Embora seus sintomas e sofrimento
fossem bastante reais, eu disse a ele que ele não tinha nenhum
grande problema psiquiátrico precisando de tratamento. O rapaz
estava claramente desapontado quando deixou meu consultório.
Não pensei muito a respeito desse caso até algum
tempo atrás, quando conheci outro paciente com uma queixa
similar. Ela tinha 32 anos e enfrentava um período de quatro a
seis horas de intensa depressão e irritabilidade após um
orgasmo, fosse sozinha ou com um parceiro. Era tão desagradável
que ela estava começando a evitar o sexo.
Investigação
Recentemente, um colega psicanalista – conhecido
por sua habilidade em descobrir psicopatologias – me ligou para
falar de mais um caso. Ele estava intrigado com um rapaz de 24
anos psiquiatricamente saudável, exceto pela intensa depressão
que durava por várias horas após o sexo.
Não há nada de estranho em um pouco de tristeza
após o prazer sexual. Como diz o ditado, depois do sexo todos os
animais ficam tristes. Mas esses pacientes enfrentavam uma
depressão intensa, forte e longa demais para ser considerada
mera tristeza.
Ainda assim, é difícil resistir à tentação de
especular sobre explicações psicológicas de comportamento
sexual. Psiquiatras brincam ao dizer que tudo tem a ver com
sexo, exceto o próprio, o que é outra forma de dizer que
praticamente todo comportamento humano é permeado com
significado sexual oculto.
Pode ser, mas fiquei pensando se, nesses casos,
não poderia ser algo simples, como uma peculiaridade na
neurobiologia do sexo capaz de fazer esses pacientes se sentirem péssimos.
O mistério
Pouco se sabe sobre o que ocorre no cérebro
durante o sexo. Em 2005, Gert Holstege, da Universidade de
Groningen, na Holanda, usou a tomografia por emissão de
pósitrons para mapear o cérebro de homens e mulheres durante
orgasmos. Ele descobriu, entre outras alterações, uma aguda
diminuição na atividade das amídalas cerebelosas, a região do
cérebro envolvida no processamento de estímulos atemorizantes.
Além de causar prazer, o sexo claramente reduz o medo e a
ansiedade.
A antropóloga Helen E. Fisher, de Rutgers, usou
imagens de ressonância magnética funcional para analisar mais
amplamente os circuitos neurais do amor romântico. Ela mostrou a
um grupo de jovens, onde todos estariam apaixonados, uma foto do
ser amado ou de uma pessoa neutra. Os participantes mostraram
uma demarcada ativação no circuito de recompensa de dopamina
apenas em resposta ao ser amado, similar à resposta cerebral a
outras recompensas, como dinheiro e comida.
Será que alguns pacientes possuem uma atividade de
retorno particularmente forte na amídala cerebelosa após
orgasmos, o que os faria sentir-se mal?
A literatura de pesquisa é praticamente silenciosa
sobre a depressão induzida pelo sexo, mas uma busca no Google
revelou diversos sites e salas de bate-papo para algo chamado de
tristeza pós-coito. Quem diria? Ali, pude ler várias descrições
quase idênticas às de meus pacientes, com relatos de diversos
remédios para a enfermidade.
Sem solução clara
Quando os médicos realizam os tratamentos usuais
sem nenhum resultado ou se veem, como no meu caso, em território
desconhecido e com poucas evidências sobre o que fazer, eles
podem considerar os tratamentos conhecidos como "de
romance". Muitas vezes, você elabora tal tratamento com
base em sua especulação sobre a biologia fundamental da
síndrome. Isso pode envolver a utilização de medicamentos
aprovados em situações para as quais eles raramente seriam
prescritos.
Uma dica de um possível tratamento é que o Prozac
e seus primos, os inibidores seletivos de recaptação de
serotonina (ISRS), normalmente interferem em algum grau no
funcionamento sexual. A serotonina faz bem para o humor, mas seu
excesso no cérebro ou medula espinhal é decididamente ruim para
o sexo.
Pensei que se eu pudesse, de alguma forma, modular
a resposta sexual de meus pacientes, torná-la menos intensa,
isso poderia embotar o estado emocional negativo posterior. Em
outras palavras, eu exploraria os efeitos colaterais geralmente
indesejáveis das ISRSs para possíveis efeitos terapêuticos.
Como pode lhe contar qualquer um que já tenha
tomado esses remédios para depressão, pode levar algumas semanas
para que se sintam melhor, mas os efeitos colaterais, como a
disfunção sexual, muitas vezes são imediatos. Para os meus
pacientes, isso acabou se tornando uma vantagem. Depois de
apenas duas semanas com ISRS, ambos disseram que apesar do sexo
estar sendo menos intensamente prazeroso, não se seguiu nenhuma
queda emocional.
Agora, há pelo menos três razões possíveis para
meus pacientes se sentirem melhor: um, a droga funcionou; dois,
ela teve um efeito placebo; ou três, houve uma flutuação
aleatória nos sintomas – eles teriam melhorado mesmo sem nenhum
tratamento.
Sugeri parar o tratamento, recomeçando-o caso o
problema retornasse. Nos dois casos, os sintomas voltaram e
foram abatidos com o remédio – sugerindo, com base nesta
amostragem reconhecidamente pequena, que o efeito do medicamento
foi real.
Se esses pacientes me ensinaram algo, é que os
problemas sexuais nem sempre indicam problemas psicológicos
sombrios e profundos. A verdade é que o órgão sexual mais
importante dos humanos é, na verdade, o cérebro. O sexo pode ser
o mais físico dos atos, mas a depressão também pode ser física –
e algumas vezes não significativa mais que uma peculiaridade da
biologia.
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