Por FRANCISCO EDSON ALVES
Rio - Ao contrário de outros países, o Brasil vem mantendo, apesar de toda a parafernália digital atual, um antigo hábito: o de trocar cartas manuscritas. O envio e o recebimentos de correspondências sociais mais do que dobrou nos últimos cinco anos. De acordo com levantamento dos Correios, por exemplo, o tráfego de cartas não comerciais e sociais, que não passou de 66 milhões de unidades em 2010, deverá chegar a 133 milhões este ano, dois milhões a mais do que no ano passado.
Ingrid começou a escrever aos 10 anos e aos 18 passou a se corresponder com amigos selecionados no computadorMaira Coelho

 

Mas é justamente graças à tecnologia que essa tradição vem crescendo. Blogs, como o ‘Trocas de Cartas’ (trocas de cartas.blogspot.com.br), estão virando uma febre, e ajudando a aproximar amantes de missivas à moda antiga, inclusive estrangeiros. Os cariocas, à frente dos gaúchos, estão em terceiro lugar entre os que mais enviam postagens à base de caneta e papel, perdendo só para os paulistas e mineiros. Já entre os que mais recebem cartas, que custam entre R$ 0,95 e R$ 4,55 (registrada), os fluminenses aparecem em segundo lugar.

Moradora de São José dos Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba (PR), Elisângela Martins Alves, ou Lily, de 36 anos, é a responsável pelo site Troca de Cartas, criado por ela em 2009. Conhecida carionhosamente nas redes sociais como ‘Semeadora de Cartas’, ela tem calos nos dedos de tanto escrever, exibidos como troféu pela dedicação “à causa”.

Lily tem acervo de mais de 2 mil cartas, guardado a sete chaves, fruto de apenas uma parte da troca de mensagens postais periódicas com pelo menos 500 pessoas nas últimas duas décadas.

 

Elisângela Alves se orgulha de ser conhecida como “semeadora de cartas”Divulgação

“Minha paixão pelas cartas começou ainda na escola, onde trocava cartinhas em sala de aula. Depois os contatos foram ampliando, até chegar em gente que nem fazia ideia de onde morava, no exterior”, conta Lily, que, orgulhosa, não cansa de receber e-mails de gente agradecendo a ‘ponte’ feita pelo blog para novas amizades e até casamentos. “A espera da carta, pelo seu conteúdo, emociona, causa uma expectativa ímpar. Já recebi tudo quanto é tipo de cartas. Desde crianças denunciando que apanhavam dos pais, até lindas histórias de amor”, revela.

Amizade real

A designer de interiores carioca, Ingrid Chilano, 24 anos, é uma das jovens que utilizam a internet como fonte para conseguir novas amizades postais. Ela lembra que começou a escrever cartas aos dez anos e aos 18 passou a se corresponder com pessoas selecionadas pelo computador, com os mesmos interesses e afinidades.

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“Mantenho uns dez amigos fixos de cartas manuscritas”, comenta Ingrid, mostrando dezenas de envelopes com selos de tudo quento é lugar do Brasil e do exterior. São correspondências que contam desde coisas banais, do cotidiano, até segredos íntimos. “Algumas são tão legais que eu releio várias vezes”, confessa, dizendo que a espera pelo carteiro lhe dá até “um friozinho na barriga” . “É mais emocionanteque receber email”, diz.
O advogado petropolitano Lauro Barretto, há anos troca cartas semanalmente com o padre Neri Feitosa, o maior biógrafo de Padre Cícero, de Canindé (CE). “Escrever carta é mais elegante do que passar mensagens por celular”, diz.
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No Blog ‘Troca de Cartas’, que tem uma página também no facebook e já superou mais de 154 mil acessos, estão `escrevinhadores´ de todas os estados, além de pessoas de países como Espanha, Inglaterra, Irlanda, Japão, Portugal, Alemanha, Chile, Austrália, China e México.