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Enquanto seguimos no Brasil as notícias de alta inflação e recessão, o Velho Continente anda na contramão pelo menos em um quesito: o crescimento é baixo, mas a inflação também. Como é de se esperar em uma economia relativamente normal, baixo crescimento econômico vem acompanhado de queda do nível de preços da economia, uma desinflação ou a temida deflação. Portanto, não há nada de muito errado com o fenômeno observado na Europa.

Assim, se no Brasil os juros subiram para combater a inflação até janeiro, na Europa os juros continuam caindo. Mas em nenhum lugar a inflação (e nem suas expectativas) convergiu para a meta. Se as atuações das autoridades monetárias tanto no Brasil quanto na Europa parecem ir na direção correta sem obter o efeito desejado, a vilã pode ser a política fiscal.

O nosso BC deveria elevar os juros mais fortemente para assegurar a inflação na meta

No Brasil, a reversão de superávits para déficits primários, o consequente aumento da dívida pública e a falta de um ajuste fiscal de verdade colocam uma perspectiva de alta da inflação. Como ninguém espera que o Tesouro controle suas contas no curto prazo e o aumento de impostos é limitado, o jeito é imprimir dinheiro, ou seja, maior inflação. Mas a resposta do Banco Central deveria ser aumentar os juros para tentar conter a inflação e mostrar para os agentes que não deixará o dragão escapar da sua jaula de 4,5% ao ano, mantendo as expectativas na meta e pelo menos evitando que esse canal gere inflação.

Porém, o combate à alta de preços é tímido e o ajuste das contas passou longe de nós em 2015, e assim continuará em 2016. Enquanto o Tesouro não encontrou uma solução (política, talvez) para cortar seus gastos e equilibrar as contas, o Banco Central cessou a alta de juros na esperança de que a recessão trará os preços para baixo. Ledo engano. Enquanto o governo continuar gerando déficits nominais de 10% do PIB, não adianta comemorar reduções temporárias do IPCA.

Já no Velho Continente, com os países excessivamente endividados e sem acesso a um Banco Central, já que delegaram tal autoridade ao Banco Central Europeu (BCE), o jeito foi cortar os gastos públicos para valer e colocar as dívidas públicas em rotas sustentáveis. O efeito foi a desaceleração das economias menos competitivas e o comprometimento do crescimento de mais curto prazo, o que reduziu a inflação corrente e sua expectativa futura. E qual a resposta do BCE? A contrária da vista no Brasil: reduzir as taxas de juros até a inflação subir. E não somente isso: o BCE tenta reavivar a economia com políticas ainda pouco exploradas, como taxas de juros negativas e afrouxamento quantitativo, mas que por ora não surtiram o efeito desejado.

A comparação com a Europa termina por aqui. Após diversas medidas inexploradas, a inflação implícita para os próximos dez anos na Alemanha (medida pela diferença entre títulos de dívida indexados e não indexados à inflação) está em 0,95%. O BCE não sabe como ir muito além em suas políticas para atingir os 2% ao ano de meta e tenta surpreender o mercado a cada discurso de seu presidente, Mario Draghi. Faltam instrumentos, já que a política fiscal se recusa ou está impedida de ser expansiva por lá – um pesadelo que gostaríamos de ter.

Já no Brasil, a inflação implícita para os próximos cinco anos está em 7,50%, mesmo com a recessão contratada para os próximos anos. O receituário é simples, conhecido pelos economistas, e sobram instrumentos: o nosso BC deveria elevar os juros mais fortemente para assegurar a inflação na meta e mostrar seus músculos, e o Tesouro deveria correr atrás de equilibrar suas contas. Um pesadelo que temos, e basta acordar para nos livrarmos dele. Seguimos em sono profundo.

Leonardo Palhuca é mestre em Economia pela Albert-Ludwigs-Universität Freiburg e editor do site Terraço Econômico.
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