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pa-votaParaguai - Opera Mundi - [Fabíola Ortiz] Preso durante ditadura paraguaia por utilizar metodologia de Paulo Freire, Martín Almada acredita em crescimento da esquerda.


Conhecido por encontrar em 1992 o "Arquivo do Terror", série de documentos que colaboraram substancialmente no estudo da Operação Condor, o advogado paraguaio Martín Almada acredita na possibilidade de uma reviravolta na eleição presidencial de seu país, que será realizada neste domingo (21/04).

Vencedor do Prêmio Nobel Alternativo de 2002, Almada duvida que os jovens votem em massa em Horacio Cartes, candidato colorado e favorito segundo pesquisas de intenção de voto.

O advogado de 76 anos, porém, não vê muitas diferenças entre Cartes e Efraín Alegre, do PLRA (Partido Liberal Radical Autêntico), mesmo partido do presidente Federico Franco. Até o dia das eleições, ele espera que o principal candidato de esquerda, Mario Ferreiro, cresça e conquiste mais do que os 10,9% do eleitorado que preveem as pesquisas.

De passagem pelo Brasil, onde voltará nos próximos meses para depor na Comissão da Verdade, o ex-preso político no período das ditaduras militares sul-americanas conversou com Opera Mundi e analisou a situação do Paraguai após o golpe de Estado que derrubou Fernando Lugo em junho de 2012.

Leia abaixo a entrevista em que Almada, que também é escritor e professor, ainda fala sobre a Operação Condor e a vida no exílio.

Eleição e principais candidatos

"As pesquisas são favoráveis a Horacio Cartes, mas pode haver uma surpresa. Não acredito que os jovens votem nele, há muita gente conservadora que está indignada pelo golpe de Estado que ocorreu".

"Cartes é o candidato nostálgico da ditadura. É sua estreia como candidato político, mas tem um passado vinculado às estruturas de poder nacional e internacional. Alegre, por sua vez é um golpista, privatista, da linha da escola de Margaret Thatcher".

"Os dois fazem a mesma campanha, não há diferença entre Cartes e Alegre".

Esquerda hoje

"A esquerda no Paraguai está atomizada. Faço minha pesquisa pessoal e vejo que possivelmente o candidato que poderia ganhar se chama Mario Ferreiro, de centro-esquerda. Ele é filho de uma família socialista, se formou numa família política e tem ideias claras. Ele se nega a fazer pacto com os golpistas e com o império. Pode haver uma surpresa. Ele pode subir".

Massacre de Curuguaty

"Curuguaty [conflito entre policiais e camponeses que deixou 17 mortos e iniciou o processo de julgamento político contra o presidente] foi uma estratégia da direita para retirar Lugo, que estava promovendo a Teologia da Libertação, uma tímida reforma. A queda de Lugo foi uma operação da direita, foi tudo orquestrado, o triunfo da direita que deu um golpe sem violência. É preciso investigar e castigar os que promoveram esse golpe, assim como também investigar as grandes empresas como Monsanto e todos os seus envolvidos".

Volta aos blocos sul-americanos

"Se aceitarem a presença de observadores internacionais, penso que o Paraguai pode voltar automaticamente ao Mercosul e à Unasul após as eleições. Há um pacto e um convênio dos presidentes de não aceitar governos que surgem de um golpe. E isso foi mantido pelos presidentes e deram o castigo merecido a Federico Franco [que assumiu a Presidência após a destituição de Lugo]".

Operação Condor

"A Operação Condor é uma conspiração contra a sociedade do conhecimento da América Latina e houve consequências. Calculamos que foram liquidadas mais de 100 mil vítimas. Metade era de dirigentes sindicais, em segundo lugar vinham os estudantes, professores, advogados, jornalistas, médicos, religiosos, gente da Teologia da Libertação, pessoas envolvidas com a metodologia de Paulo Freire pela educação libertadora, intelectuais, ou seja, a classe pensante da América Latina".

"Meu pecado fundamental foi ter aplicado a metodologia freireana. Eu era diretor de uma escola primária no Paraguai e apliquei a teoria de Paulo Freire. A polícia política se informou que eu estava fazendo essa 'prática diabólica'. Fiz uma tese de doutorado na Argentina e questionei o sistema educativo paraguaio a partir de um modelo que aprendi".

"O Condor continua funcionando hoje em dia através da Conferência de Exércitos Americanos que se reúne a cada dois anos. O Condor está debaixo da democracia".

Pré-Condor

"O Condor nasceu oficializado no Chile, em 1975, mas já funcionava antes. Havia um pré-Condor no Brasil, quando os militares deram o golpe em 1964. No Brasil caiu uma bomba atômica que teve impacto em toda a América Latina. Descobrimos que havia um centro de preparação anti-guerrilheiro na cidade de Manaus, antes mesmo de criar a Escola das Américas no Panamá".

Prisão em novembro de 1974

"Foram 30 dias de interrogatório e eu conhecia cada um por seu acento. Vi 1.200 torturas por ter questionado o sistema educativo. Disseram que eu era terrorista intelectual de toda a subversão do Paraguai. Eu era uma espécie de vilão", contou.

"Não sei se porque eu era advogado ou porque queria morrer, mas enfrentava permanentemente o exército e a polícia. Tínhamos fome e sede. Depois fiz uma greve de fome por 30 dias e, graças a Anistia Internacional e ao comitê inter-igreja católico e protestante, recuperei minha liberdade".

Vida na Argentina

"Saí do Paraguai acreditando que deixava um inferno para me proteger, mas vi que fora era pior. Na Argentina, a repressão era muito forte. Uma vez, na universidade, avistei um adido militar argentino no Paraguai vestido de civil que caminhava pelo corredor. Trinta anos depois descobri que aquele homem estava lá para preparar a lista das pessoas que seriam decapitadas, entre elas, estava eu".

Descoberta de documentos em 1992

"Certa vez tocou o meu telefone, uma mulher dizia: 'professor, seus papeis estão fora de Assunção, não estão na central da polícia'. Era uma senhora elegante e disse que queria colaborar com a justiça, 'Sei que o senhor sofreu muito' e me levou ao plano da operação Condor. Essa mulher nunca apareceu mais na minha vida. Vinte anos depois, suspeito que fosse esposa de um alto militar".

"[Ao achar o "Arquivo do Terror"] Eu tremia de muito medo, receava que a polícia fosse resgatar os documentos. No fundo encontramos a ata de nascimento do Condor, pois o documento de novembro de 1975 apenas dizia reunião de inteligência. Os países tinham a maior preocupação contra a subversão e, sobretudo, por salvar a civilização ocidental cristã das garras do comunismo", destacou.

Comissão da Verdade brasileira

"Minha pesquisa contribuiu muito porque a Argentina, por exemplo, não encontrou documentos. É o que queremos fazer no Brasil, queremos contribuir também com tudo o que descobrimos há 20 anos e a posteriori para que se conheça a verdade e se faça a justiça".


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