Os brasileiros querem uma presidente que seja mulher, casada, de classe média, com curso superior, senso de justiça – e que, de preferência, não pinte o cabelo. O brasileiro deixaria seu filho pequeno aos cuidados de Marina Silva, gostaria de ter Dilma Rousseff como síndica e Aécio Neves como vizinho. As frases resumem a primeira parte de uma pesquisa feita para ÉPOCA pela empresa Paraná Pesquisas, centrada na personalidade dos candidatos. O foco da segunda parte são as ideias para o governo – e ela revela que os brasileiros desejam um presidente da República preocupado com saúde pública, educação e segurança, nesta ordem. Na hora de escolher um candidato, as ideias são importantes, mas a personalidade é tão ou mais relevante. “No Brasil, o voto é orientado para as pessoas e não há uma forte identificação partidária”, diz o sociólogo e cientista político Antonio Lavareda. “O sentimento que cada candidato desperta no eleitor torna-se o principal fator para a decisão do voto.”
De nada adianta o eleitor concordar com o programa de um candidato se ele não acreditar que ele é capaz de implantá-lo. A palavra-chave, aqui, é confiança. Além da confiança, pesquisas voltadas para a personalidade do candidato medem outro fator também imponderável: a empatia. Confiança e empatia são os sentimentos que guiam o eleitor na definição do voto. Em 1994, o brasileiro confiou que Fernando Henrique Cardoso era o homem certo para desarmar a bomba da inflação. Essa confiança foi renovada em 1998. Em 1989, 1994 e 1998, o brasileiro já vivia um caso de amor com Luiz Inácio Lula da Silva, mas não confiava nele – em parte, por causa das propostas radicais de seu partido. Essa confiança veio em 2002, com a Carta ao Povo Brasileiro – em que Lula se comprometeu a não fazer rupturas na economia.
Segundo a pesquisa, Aécio e Marina pontuam melhor que Dilma na área da empatia. Dos brasileiros, 33,3% não gostariam de ter Dilma como vizinha. Aécio, vencedor nesse quesito, tem metade dessa rejeição, apenas 15,2%. Provavelmente, os eleitores veem nele um vizinho bonachão, daqueles que convidam para assistir ao jogo do Brasil e providenciam a cerveja e os salgadinhos. Um em cada três brasileiros chamaria Marina para cuidar de seu filho por um dia. Nada pode traduzir maior empatia, nem prova tão inequívoca de confiança. Em itens que envolvem confiança, mas não necessariamente empatia, Dilma pontua bem. Os eleitores preferem Dilma a Aécio ou Marina nas funções de síndica de prédio, representante numa ação judicial ou chefe no trabalho. Dilma passa uma imagem austera – seu temperamento forte, dado às explosões, é visto como valor positivo em algumas circunstâncias.
O levantamento traz surpresas. Tido como um povo machista, o brasileiro prefere ser governado por uma mulher. Claro que haver duas mulheres na ponta da corrida presidencial influenciou a escolha. O mesmo brasileiro que, por duas vezes, elegeu Lula acha importante que o presidente tenha curso superior. O senso de justiça é visto como algo infinitamente mais importante que um temperamento solidário ou tolerante. Na área da economia, “garantir a geração de empregos e de renda” apareceu em empate técnico com “baixar impostos”. Trata-se de uma novidade importante num país avesso a ideias liberais, em que nenhum dos três candidatos empunha de modo explícito a bandeira da redução dos impostos ou da diminuição do Estado.
As características
Os brasileiros observam em Dilma características ligadas à capacidade administrativa, enquanto associam Marina à confiança, e Aécio à simpatia. Dilma se encaixa no perfil da síndica ideal (31,9% gostariam de tê-la nesse papel) e de gerente de uma grande empresa (31,7%). É rejeitada como vizinha. Mais de um terço dos entrevistados não gostaria que ela morasse na casa ao lado, enquanto Aécio é rejeitado por apenas 15,2%. A mais confiável é Marina, a quem 32,6% dos pesquisados entregariam a guarda dos filhos por um dia. Para o psicanalista Jorge Forbes, os brasileiros associam Dilma à “razão ascética”, aquela que diz: “Eis os números, e com eles resolverei os problemas do Brasil”. Marina representa a “razão sensível”, em que os números pesam na solução dos problemas, mas também “a vivência, a sensibilidade, a simpatia e a presença”. E Aécio? “Aécio joga no meio de campo. Não deixa nada claro”, diz Forbes.
O perfil
Os eleitores brasileiros parecem ter gostado de ter uma mulher no Palácio do Planalto. Dos entrevistados pela Paraná Pesquisas, 39,5% gostariam de repetir a experiência. Apenas 22,6% dizem preferir um homem, enquanto 36,4% se disseram indiferentes à questão. Os pesquisados se mostraram divididos quanto ao casamento. Para 46%, não faz diferença se o próximo presidente é casado, solteiro ou divorciado, enquanto 45,8% preferem que ele seja casado. No quesito religião, tão debatido na campanha, 51,6% também se disseram indiferentes em relação às crenças do próximo ocupante do Planalto. Em outros aspectos da vida pessoal, os entrevistados se mostraram mais tradicionais. Preferem um presidente de classe média, com formação superior e que use roupas clássicas. “A pesquisa mostra que a população não quer alguém para uma festa”, diz Jorge Forbes. “Ela não quer um desbravador, mas garantias.”
As prioridades
O próximo presidente precisa dar prioridade à saúde e à educação, aumentar o salário dos professores, reduzir impostos, gerar emprego e renda. Essas são algumas das principais aspirações dos entrevistados pelo Paraná Pesquisas. Quando questionados sobre qual deveria ser a prioridade número um a partir de 2015, 78,2% dos pesquisados responderam saúde. Educação ficou em segundo, com 51,3%. A tão propalada reforma política, apontada por muitos como uma panaceia para os males do país, foi apontada por apenas 5,6% dos entrevistados. A pesquisa trouxe também uma novidade. Na lista das prioridades na economia, a redução de impostos, um tema esquecido pelas principais campanhas, apareceu praticamente empatada com a geração de emprego e renda. Para melhorar a educação, a maior parte dos pesquisados (29,2%) avalia que a medida mais eficaz a tomar é aumentar o salário dos professores.
04/10/2014 - Edição 853
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