Innovatrix

Clemente Nobrega

O capitalismo concentra renda? Sim, concentra, mas Picketty tem um problema…

Innovatrix

Pickett-Aula2

 

Não precisamos de Thomas Picketty para saber que a riqueza tende a se concentrar. Não é novidade, é informação mais que constatada.

 Num post anterior , mostrei como um processo análogo de concentração de riqueza já foi constatado até em simulações em computador usando agentes digitais – a concentração “emergiu” naturalmente (sem ter sido programada) da própria dinâmica das interações entre os agentes.

Isso ocorre por causa da estrutura estatística do processo de geração da riqueza.  Num outro post (2008), eu já tinha explicado isso.  Deixa eu relembrar rapidamente aqui:

A distribuição de riqueza “natural” numa população não ocorre em torno de um valor médio, e ela não cresce mais (ou menos) rapidamente porque a média das pessoas produz mais (ou menos) devagar. Ao longo do tempo, alguns (poucos) geram desproporcionalmente mais que a média (muito, muito, muito, mais).

Aqueles poucos “desproporcionais” ficam hiper-ricos, é verdade, mas todo mundo fica mais rico também (não tão “hiper ricos”, mas mais ricos de qualquer forma). Esses “desproporcionais” são a chave para o aumento da riqueza – nós os conhecemos pelo nome de “empreendedores”.  O vídeo em que explico um pouquinho da natureza do empreendedorismo está aqui.

Temos a tendência de achar que em todos os domínios têm que haver um “normal”; que as coisas vão se acomodar em torno de alguma “média”, mas isso é ilusão. Nassim Taleb criou os termos “Mediocristão” e “Extermistão” para falar de nossa obsessão pelo “normal.
Mediocristão é o lugar em que o médio, o normal e o esperado prevalecem. No Mediocristão não existe um evento que possa mudar as coisas decisivamente.
Por exemplo: pegue mil pessoas e tire a média de suas alturas – elas se distribuem em torno de uma média. Não é possível encontrar alguém com alturas extremas – 10 cm ou 1 km – digamos. Desvios da média ocorrem dentro de uma faixa muito limitada e desaparecem rapidamente à medida que você se afasta dela (média). Não existe a hipótese de que uma única pessoa, ao entrar na amostra altere a média dos 1000. A média é estável. Peso, altura, características físicas em geral… São do Mediocristão.

Agora considere a riqueza das pessoas.
Pegue, ao acaso, mil pessoas com graus variados de riqueza e tire a média. Agora coloque o Bill Gates na amostra. Ele distorce violentamente a média.
A riqueza dos indivíduos mora no Extremistão. Não há limites naturais para eventos no Extremistão.
Ali, um único evento (chamado Bill Gates neste caso) distorce totalmente a distribuição.
Se duas pessoas, tomadas ao acaso, têm pesos somados de 160 Kg, pode apostar que os pesos de cada uma estarão numa faixa previsível – um terá 90 Kg outro 70Kg, ou por aí. Pesos de pessoas habitam o Mediocristão.
Mas, se dois indivíduos, tomados ao acaso, têm rendas somadas de 15 milhões de reais, é muito provável que um ganhe R$ 14,99 milhões e o outro seja duro. A riqueza das pessoas mora no Extremistão.  Aqui não vale média. Não vale distribuição normal. Não vale Gauss.
O que interessa na vida em sociedade está ficando cada vez mais Extremistão.

Ao comentar o livro de Picketty, Nassim Taleb escreveu:

“No mediocristão, as mudanças ao longo do tempo são o resultado de contribuições coletivas… da média. No extremistão, essas mudanças vem das caudas (fat tails). Desculpe se você não gosta disso, mas é puramente matemático (estou falando de gente real – verdadeiros tomadores de risco, como os empreendedores)”.
Quem gera riqueza é o empreendedor – aquele que arrisca mais que a média  em busca de ganhos também muito maiores do que a média. É uma coisa estatística cuja origem são as diferenças que existem entre as pessoas – graus variados de conhecimento, apetite ao risco, atitudes diante da vida, exposição ao acaso, preparo, motivação, ambição etc… É natural que a riqueza se concentre, o que não quer dizer que seja bom (“natural” não tem nada a ver com “bom” ).

O problema é que há uma tendência a se crucificar os “ricos” como se só se ficasse rico tomando dos pobres. Isso é absurdo. Picketty trai esse preconceito ao sugerir que se tome 80% da renda deles via impostos. Com isso ele vai matar o empreendedorismo (empreendedor é motivado por ficar “desproporcionalmente” rico). Se matar o empreendedorismo, o capitalismo “bom” morre junto, e todo mundo ficará mais pobre. Simples assim.

Ser contra o fato de a riqueza ser gerada nos extremos (não na média) é como, digamos, ser contra o teorema de Pitágoras – querer punir  a  hipotenusa porque ela exerce um “poder desproporcional” sobre os catetos. É tentar “corrigir a distorção” de serem necessários dois catetos ao quadrado de para produzir uma hipotenusa ao quadrado. Não é muito inteligente isso, certo? O que é inteligente, então?

(Continua no próximo).

Leia também