Economia Negócios

Dólar fecha em alta de 1,8%, a R$ 4,05, maior cotação da História; Bolsa cai 0,7%

Recorde anterior, de R$ 3,990, era de 10 de outubro de 2002, semanas antes da eleição de Lula
Foto: Chris Ratcliffe / Bloomberg News
Foto: Chris Ratcliffe / Bloomberg News

RIO - O dólar fechou nesta terça-feira na maior cotação desde a criação do Plano Real, em 1994, ultrapassando a barreira dos R$ 4. O dólar comercial encerrou a sessão em alta de 1,80%, cotado a R$ 4,052 para compra e a R$ 4,054 para venda. Na máxima do dia, a divisa encostou em R$ 4,07, atingindo R$ 4,068. Foi a quarta valorização consecutiva da moeda americana.

Na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), as ações operaram em forte queda ao longo do dia, mas ganharam algum fôlego no fim do pregão. O índice de referência Ibovespa, que chegou a recuar 2,82%, encerrou o dia com baixa de 0,70%, aos 46.264 pontos. A queda acompanhou o mau humor dos mercados internacionais, que registram baixa intensa com incertezas acerca do crescimento global. Um dos destaques do pregão da Bovespa foram as ações preferenciais da Petrobras, que chegaram a cair 6,7%, atingindo a mínima de R$ 6,81 — menor cotação registrada durante um pregão desde agosto de 2003. No fim do dia, porém, encerraram com queda de 4,52%, a R$ 6,97.

A evolução do dólar desde 2002 Foto: Editoria de Arte
A evolução do dólar desde 2002 Foto: Editoria de Arte

No câmbio, até então, o recorde para o fechamento do dólar havia sido os R$ 3,990 registrados em 10 de outubro de 2002. Naquele mesmo dia, a moeda americana havia atingido a máxima durante a sessão de R$ 4,005, embora houvesse terminado abaixo R$ 4. Naquela ocasião, semanas antes do segundo turno das eleições presidenciais, os investidores do mercado financeiro temiam as implicações da possível vitória do candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva.

CONTEXTO POLÍTICO

Hoje, a valorização do dólar se deu em contexto político tenso. O Congresso decide na noite desta terça se derruba ou não os 32 vetos da presidente Dilma Rousseff a medidas que aumentam gastos e podem inviabilizar o ajuste fiscal . Entre eles está o veto ao reajuste médio de 56% aos servidores do Poder Judiciário. Com medo de derrota, o próprio governo articula o adiamento ou o esvaziamento da sessão. O líder do governo no Senado, Delcídio Amaral (PT-MS), defendeu o cancelamento da sessão.

Mas, à tarde, o governo decidiu enfrentar a votação dos vetos na sessão do Congresso, como forma de acalmar o mercado. A estratégia funciona, segundo Maurício Pedrosa, estrategista da Queluz Asset Management.

— O clima hoje foi de desastre, mas as ações começaram a recuperar parte das perdas no fim do pregão, com o governo decidindo seguir adiante com a votação. Se ele fez isso, a leitura dos investidores é que ele deve ter confiança na manutenção dos vetos. Então nós colocamos um bode na sala e acabamos conseguindo retirá-lo — disse.

FECHAMENTO PERTO DA MÁXIMA

Mas o efeito não foi sentindo no câmbio, e o dólar fechou a sessão perto da máxima do dia.

— Além da valorização do próprio dólar devido a uma postura mais incisiva do Federal Reserve (Fed, banco central dos EUA) quanto ao aumento de juros, a dinâmica de desvalorização do real tem sido muito rápida desde o rebaixamento da nota do Brasil promovido pela Standard & Poor’s. A questão é que se fala há semanas de uma solução para o Orçamento mas nada de concreto foi feito. Isso vai pressionar o câmbio nos próximos meses — afirmou a turca Ipek Ozkardeskaya, analista do London Capital Group em Londres.

Ipek prevê que o dólar terminará o ano cotado entre R$ 4,20 e R$ 4,25.

— O Brasil pode evitar novos downgrades por outras agências, mas tudo depende da evolução das conversas sobre o Orçamento e a resolução das questões políticas. Até agora, porém, a dinâmica das discussões não tem sido favorável para o câmbio — acrescentou.

Para Raphael Figueredo, analista da Clear Corretora, apesar de a conjuntura ser parecida com a dos dias anteriores, o recorde no câmbio é simbólico.

— O dólar acima da cotação de R$ 4, um divisor de águas, provoca um grande efeito psicológico sobre o mercado. Mas os motivos são um pouco do mais do mesmo. Há ainda desconfiança do mercado internacional que cai forte com preocupação com o crescimento global. No cenário doméstico, levantou muita preocupação a reunião do ministro Joaquim Levy, da Fazenda, com a agência Fitch, levando à preocupação sobre um iminente rebaixamento da nota de crédito do Brasil — afirmou.

DÓLAR TURISMO JÁ ULTRAPASSA R$ 4,50

O dólar comercial é referência nas operações de comércio exterior e é negociado em preço muito mais baixo que o cobrado de turistas nas agências de câmbio. O dólar turismo já passa dos R$ 4,50 para os viajantes que decidem comprá-lo no formato de cartão pré-pago , com maior incidência de Imposto sobre Operação Financeira (IOF).

Entre as 32 principais moedas do mundo, o real é a que mais perdeu valor contra o dólar no ano. Desde o fim de dezembro, a divisa americana acumula alta de 52,3%. Em 12 meses, a alta acumulada é de 69,3%. Nesse tipo de comparação, apenas o rublo perdeu tanto valor, mas em um contexto russo marcado por sanções econômicas provocadas pelo envolvimento do país no conflito ucraniano.

Ontem, indicações de que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) irá elevar os juros até dezembro e a persistente preocupação com o ambiente político e a implementação do ajuste fiscal levaram o dólar comercial a atingir R$ 3,999 durante a sessão , mas a divisa encerrou os negócios a R$ 3,982, em alta de 0,53%.

A alta do dólar de ontem se manteve mesmo após o Banco Central realizar, pela manhã, dois leilões de linha (em que há compromisso de recompra), no total de US$ 3 bilhões. Depois da operação, no início da tarde, a cotação da moeda americana avançou e alcançou a máxima do dia, de R$ 3,999.

BOLSAS EXTERNAS EM FORTE QUEDA

No mercado acionário, as Bolsas europeias fecharam em forte queda, puxada pelo desempenho ruim de ações ligadas a commodities e de montadoras — sobretudo a Volkswagen, envolvida em escândalo de manipulação dos registros de emissões de gases poluentes dos seus veículos nos EUA. O índice de referência do continente, o Euro Stoxx, caiu 3,41%, enquanto a Bolsa de Londres recuou 2,83%. Em Paris, o pregão teve baixa de 3,42%, enquanto a Bolsa de Frankfurt recuou 3,80%. Em Wall Street, o Dow Jones desvalorizou-se em 1,09%, enquanto o S&P 500 teve baixa de 1,23%.

No Ibovespa, 42 das 64 ações que compõem o índice fecharam em queda. A Petrobras teve baixa de 3,13% (ON, com voto, a R$ 8,35) e 4,52% (PN, sem voto, a R$ 6,97). Entre outros fatores, a empresa foi afetada pela queda do petróleo ao longo do dia, apesar de a commodity ter recuperado o terreno positivo no fim da tarde.

— Além do petróleo, a instabilidade política também reflete sobre a empresa, pois ela segue espelhando muito o comportamento do governo. E há também a questão da alta do dólar, pois 70% de sua dívida é denominada na moeda americana. Isso acaba criando uma espécie de bola de neve, uma vez que a empresa é considerada grau especulativo e já enfrenta enorme dificuldade para se financiar — explicou Raphael Figueredo.

A Vale recuou 2,36% (ON, a R$ 19,46) e 2,23% (PN, a R$ 15,35). Já os bancos passaram o dia em baixa mas se recuperaram no fim da sessão. O Banco do Brasil fechou estável (-0,06%, a R$ 16,28), enquanto o Bradesco teve alta de 0,40% (PN, a R$ 22,70) . No Itaú Unibanco, a alta foi de 0,95%, a R$ 27,49.

Registrou queda de 7,95%, impactando negativamente o índice, a rede de universidades Kroton. A empresa sofreu tombo após publicação de nota no site da revista “Veja” afirmando que o programa de Financiamento Estudantil (Fies) pode ser alvo de uma CPI. Em comunicado, a Kroton refutou as informações:

“Sobre o Fies, a Kroton destaca que segue rigidamente e com total lisura as regras estabelecidas pelo Ministério da Educação (MEC), seguindo as leis e adotando sempre de forma transparente as melhores práticas na oferta e gerenciamento do programa”, disse.