Economia

Jack Dorsey, fundador do Twitter: ‘Sou amigo de Mark Zuckerberg, mas não no Facebook’

Executivo acha que o novo app de vídeo Vine tem tudo para crescer no Brasil

Jack Dorsey, fundador do Twitter, no terraço do Hotel Fasano, em Ipanema.
Foto: Foto: Rennan Setti
Jack Dorsey, fundador do Twitter, no terraço do Hotel Fasano, em Ipanema. Foto: Foto: Rennan Setti

RIO — Jack Dorsey, fundador e hoje presidente do conselho do Twitter, se parece com um tweet. Apesar de alto, é tão magro que parece caber em 140 caracteres... ou seis segundos, se comparado ao novo app de vídeo Vine , recentemente lançado pela rede de microblogs. Dorsey, aos 36 anos, é considerado uma das 35 pessoas mais influentes no mundo pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT), tem uma fortuna estimada em US$ 1,1 bilhão, e a rede de microblogs que criou há sete anos chegou a ser avaliada recentemente em US$ 10 bilhões, com mais de 500 milhões de usuários e 400 millhões de tweets enviados por dia. Com tudo isso, em seu primeiro dia no Rio, botou uma camisa e saiu por aí passeando pela orla de Ipanema, deixando o pessoal de sua segurança de cabelo em pé.

— Cadê ele? — procuraram na recepção do hotel Fasano, onde se hospedou ( nesta quinta-feira ele esteve em evento em São Paulo ).

— Ué, saiu — foi a resposta.

Para Dorsey, a tecnologia tende a desaparecer por trás dos serviços, deixando os usuários livres de ter de se preocupar com ela. Além de executivo do Twitter, ele é criador e diretor da Square, empresa especializada em pagamentos pelo celular, que em algum momento deve chegar ao Brasil (está em conversações por aqui sobre o tema.)

— Estamos especialmente interessados no mercado daqui, pois os brasileiros adotam tecnologias rapidamente e são apaixonados por elas — disse Dorsey ao GLOBO. — Já percebemos isso com a rápida aceitação do Twitter aqui (são 40 milhões de usuários no país, atrás apenas dos EUA) e estamos curiosos para ver como o Vine evolui entre os brasileiros.

Curiosa é igualmente a inspiração do americano para criar o Twitter. Diz ele que a rede nasceu do seu amor pelas cidades, por ver uma cidade funcionando em tempo real no computador.

— Assim, a partir dos 14 anos de idade comecei a programar software para despachos e rotas de todo tipo: correio, ambulâncias, bombeiros... todos informando onde estavam e o que faziam. E o Twitter nasceu daí, só que voltado para pessoas comuns — lembra. — Imaginei-as contando onde estavam e o que estavam fazendo, e o mais importante: todo mundo poderia ver isso. E assim dá para saber o que está rolando no Rio, em São Paulo ou em qualquer outro lugar do mundo.

Dorsey tentou criar o Twitter já em 2001, mas segundo ele o timing não era o certo, nem havia uma equipe pronta para tal. Já em 2006 a internet estava madura para a novidade, baseada em SMS. Ela ganhou impulso no ano seguinte, a partir do festival SXSWi (South by Southwest Interactive), quando tweets espalhados por telões no evento chamaram a atenção. Se naquele ano (2007) os twitteiros postavam 400 mil vezes por trimestre, em 2008 o número de tweets cresceu para 100 milhões por trimestre e em 2010 já chegavam a 50 milhões por dia.

E por que 140 caracteres por tweet (ou seis segundos por vídeo em loop do Vine?)

— Acredito que limites estimulam a criatividade, eis o porquê — afirma Dorsey. — Se eu lhe desse uma caneta agora e lhe mostrasse uma tela enorme em branco, você talvez hesitasse, preocupado em escolher onde começar. Mas se eu lhe entregasse um cartão de visitas, facilmente decidiria onde assinalar algo. Este é o princípio conceitual dos 140 caracteres (e dos seis segundos do Vine), mas há também um prático: queremos que o Twitter funcione em tudo quanto é dispositivo, de um celular baratinho no meio do Quênia a um smartphone caro nos EUA.

O executivo lembra que os 140 caracteres também se baseavam num limite de 160 para o SMS, do qual eles retiraram 20. E lembra que o tweet não é só o texto, pode ser uma legenda para um vídeo, uma foto, uma introdução a um link.

Para Dorsey, o Vine é uma nova fronteira, e a limitação de seis segundos vai fazer com que as pessoas planejem, componham mais seus vídeos para passar as mensagens de forma mais objetiva.

— Considero-o uma nova forma de arte, e acho que vai acabar sendo maior que o YouTube. Está crescendo mais rápido do que tudo que já vi antes — afirma. — Hoje já olho para fotos e as acho tediosas; quero olhar para o mar e ver o movimento das ondas, por exemplo. Então, com o Vine, posso capturar isso rapidamente. E também contextualizar melhor onde estou e o que faço naquele momento.

O Twitter por vezes é definido como uma rede social, uma rede de microblogs ou uma rede de informações em tempo real. Para Dorsey, ele é isso tudo, mas principalmente um lugar aonde se vai para saber o que acontece, não só no mundo, mas à sua volta. Diferentemente do Facebook, que é uma rede social por definição, feita para encontrar os amigos. Em suma, cada um no seu quadrado.

— Sou amigo de Mark Zuckerberg, mas não no Facebook — alfineta. — Não tenho conta no Facebook.

A propósito, o Twitter está longe de planejar uma oferta pública inicial de ações (IPO) e abrir capital, como fez Zuckerberg. Dorsey diz que o faturamento vai bem, obrigado, a partir dos produtos anunciados e promovidos, mas que nunca pensa em IPOs a não ser quando fala com a imprensa.

— Não é saudável ficar pensando num IPO como um objetivo. É só mais um evento para levantar fundos — afirma. — Nos preocupamos mais em desenvolver novos produtos e serviços.

O futuro da internet, segundo o executivo está nos smartphones, que permitem contatar as pessoas em todos os lugares, mas também nos dispositivos “vestíveis”, os “wearables”, como relógios, carteiras e pulseiras conectados, por exemplo. E cada vez mais em tempo real. Mas, ao ser perguntado sobre conexões em óculos, como o projeto Google Glass, foi direto.

— Óculos? Não estou certo se o caminho é por aí... — alfineta. — Eu não colocaria esses óculos.

Outro caminho é o serviço de pagamentos por smartphones Square, que Dorsey já lançou nos EUA e no Canadá e pretende introduzir em vários mercados, inclusive aqui. Mas há dificuldades:

— Não é algo tão simples quanto o Twitter, que você põe no ar e cresce sozinho. É preciso negociar com reguladores, operadoras, bancos, administradoras de cartão de crédito — explica, dizendo que não tem pressa de chegar primeiro ao mercado nacional, mas trazer a melhor experiência aos usuários.

Dorsey não acredita que a tecnologia de pagamentos móveis NFC, por aproximação do celular, seja o futuro. Ele crê que o usuário não tem que se preocupar com a tecnologia na hora em que deseja usufruir de um serviço.

— Hoje tive um almoço maravilhoso no Rio, mas a conta demorou a vir, na hora de pagar tudo demorou mais que o almoço — comentou. — Nos EUA, a Square já tem o serviço Wallet, em que, com os dados do cartão de crédito embutidos no celular, a pessoa entra num estabelecimento, já é identificada pela rede wireless, consome e apenas diz seu nome para pagar ao sair. Pegar o celular para tocar numa máquina de cartão, no NFC, gasta tanto tempo quanto passar o cartão físico na máquina. A tecnologia tem que desaparecer, e o serviço, prevalecer.

Sobre a tendência da moeda virtual bitcoin, hoje tão falada, Dorsey tem suas dúvidas. Explica que a ideia veio dos chamados “cripto-punks”, programadores obcecados com criptografia que imaginam criar um dinheiro digital tão impossível, ou difícil, de rastrear quanto dinheiro em espécie.

— O futuro do bitcoin depende de ele oferecer valor, velocidade e segurança maiores que os de outros tipos de moedas — diz. — Mas atualmente, quando eu penso em bitcoins, me pergunto: minha mãe usaria? Minha avó entenderia? Hoje, de jeito nenhum.

Volta e meia descrito como o herdeiro espiritual do guru da Apple Steve Jobs, Dorsey afirma que tal asserção o faz humilde:

— A maior qualidade de Steve Jobs sempre foi dizer “siga seu próprio caminho, não o meu”. Há vários caminhos para o sucesso, não apenas o dele, e o mundo se beneficia dessas múltiplas opções. Certamente tenho minha própria perspectiva. Acho a vida de Jobs incrível, e admiro a Apple; considero que acima de tudo Jobs foi um artista. Conseguia conceber as coisas sem limitações e convencia as pessoas a transformá-las em realidade, em trazê-las para o mundo. Foi uma grande perda.