• Edson Caldas
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Uma das salas reformadas do Belas Artes, que abre neste sábado em SP (Foto: Sylvia Masini/Belas Artes)

Uma das salas reformadas do Belas Artes, que abre neste sábado em SP (Foto: Sylvia Masini/Belas Artes)

Quem andava durante a última semana pela calçada da rua Consolação, no centro de São Paulo, deparava-se com uma fachada em reforma na altura do número 2.423. Dentro daquele espaço, mais de 80 trabalhadores corriam para fazer os reparos finais da obra. Afinal, tudo tinha de estar pronto para este sábado (19/07), dia da reinauguração de um dos cinemas mais tradicionais da cidade.

Depois de passar três anos com as portas fechadas, o popular Cine Belas Artes volta a receber o público. A reabertura é resultado de anos de manifestações realizadas por amantes do cinema, além de uma arrecadação de R$ 7 milhões de iniciativas privadas. Do total, R$ 1,8 milhão veio da Caixa Econômica Federal. O patrocinador, inclusive, ganhou espaço no novo nome do cinema: Caixa Belas Artes.

“Para nós, foi um presente”, diz Clauir Luiz Santos, diretor de marketing e comunicação da Caixa, a NEGÓCIOS. “Imediatamente abraçamos a proposta.” As negociações foram intermediadas pela Secretaria Municipal de Cultura. Segundo ele, quando o projeto foi oferecido, a instituição já tinha noção da importância do cinema para a cidade, mas se impressionou a com repercussão. “Vimos que era muito mais importante do que imaginávamos”, afirma.

O local fechou em março de 2011 por falta patrocínio - antes dado pelo banco HSBC - e aumento no valor do aluguel. Em janeiro daquele ano, três passeatas em protesto contra seu fim foram do cinema até o Museu de Arte de São Paulo (MASP), na Avenida Paulista. Surgiu então o Movimento Cine Belas Artes (MBA), criado por ativistas, com o apoio de entidades culturais. Em seguida, o grupo promoveu um debate sobre a política de preservação do patrimônio imaterial da cidade, mas não foi o suficiente. A última sessão do cinema aconteceu no dia 17 de março, com ato de protesto.

Luta pela reabertura

Cine Belas Artes reabre com patrocínio de R$ 1,8 milhão da Caixa Econômica (Foto: Fabio Ornelas/ Movimento Cine Belas Artes )

Movimento Cine Belas Artes (Foto: Fabio Ornelas/ Movimento Cine Belas Artes )

O movimento não desistiu. Após o fechamento do espaço, passou a promover atividades públicas e negociações com representantes dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, além do Ministério Público. Em dezembro de 2011, conseguiu uma liminar na Justiça que reabriu os processos de tombamento. A questão ganhou 90 mil apoiadores no aplicativo Causes do Facebook, além de 28 mil assinaturas em diferentes abaixo-assinados, tanto online quanto físicos. No meio do caminho, enquanto o grupo buscava maneiras de viabilizar uma possível reabertura, acabou elaborando propostas que também favoreciam outros espaços culturais na mesma situação.

"A volta do Belas Artes pode fortalecer um modelo inovador para salvar cinemas de rua""

Beto Gonçalves, coordenador do Movimento Cine Belas Artes

“O movimento foi ganhando maturidade”, diz Beto Gonçalves, coordenador da iniciativa. “Iniciou pedindo que o cinema não fechasse, mas, na luta pelo tombamento, passou a estudar leis e ter muito contato com autoridades, Ministério Público e entidades da sociedade civil.” Segundo ele, políticas como as adotadas neste caso podem beneficiar economicamente outros locais que estão fechando. “Acreditamos que a volta do Belas Artes pode ajudar a fortalecer um modelo inovador para salvar cinemas de rua no Brasil — a parceria entre a sociedade civil, o poder público e a iniciativa privada.”

Qualidade
Agora, o cinema volta a abrir as portas e é recebido com ansiedade por parte do público. Para Barbara Sturm, programadora do Caixa Belas Artes e uma das responsáveis por sua reinauguração, o espaço resgata o clima do “ir ao cinema”, que, segundo ela, tem sido deixado de lado. “Você senta para tomar um café, bater-papo, conhecer outras pessoas, ir assistir a um filme e acabar ficando sabendo de outro que nem conhecia”, diz.

Barbara acredita que o momento é importante principalmente por se tratar de “uma conquista da população”. Ela e o pai André Sturm — diretor executivo do Museu da Imagem e do Som de São Paulo (MIS), responsável pela administração do Belas Artes desde 2003 e dono da marca — têm uma relação bem próxima com a sétima arte. Os dois são donos da distribuidora Pandora Filmes. “Para nós, [reinaugurar] é maravilhoso. Quando o cinema fechou, foi uma sensação de luto.”

"Quando o cinema fechou, foi uma sensação de luto""

Barbara Sturm, programadora do Caixa Belas Artes

A programação continua diferenciada e, no fim de semana de estreia, títulos especiais serão exibidos. "Medos Privados em Lugares Públicos", de Alain Resnais - que permaneceu durante três anos em cartaz antes do fechamento - volta a ser apresentado, além de longas como o japonês "Norwegian Wood: Como nas Canções dos Beatles", o grego "Miss Violence", o francês "Amar, Beber e Cantar" e o britânico “Todos os Dias”. Um dos destaques da nova fase é a volta do “Noitão”, a maratona de filmes promovida pelo cinema da meia-noite às 6h, que começa em agosto.

A organização espera “um movimento bem intenso” no local a partir das 15h30 deste sábado, quando o prefeito Fernando Haddad, o secretário municipal de Cultura, Juca Ferreira, e André Sturm cortarão a faixa inaugural.